Os perigos do “Sexting”

Os artigos disponíveis foram publicados na revista semana médica, revista da Ordem dos Médicos, jornal Público e jornal Expresso.

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Actualmente os avanços da sociedade associados às novas tecnologias e às redes sociais da internet criaram vários problemas, induzindo alterações do comportamento humano. A evolução é tão rápida que é bastante provável que estejam a surgir novas patologias mentais de que a psiquiatria ainda não teve o tempo necessário para estudar e catalogar.

O “sexting” é a actividade entre adolescentes que consiste em captar e divulgar imagens de si próprios ou de terceiros, através de mensagem de telemóvel ou da internet, com semi-nudez/nudez ou de conteúdo sexual. Este fenómeno tem vindo a aumentar nos EUA entre adolescentes. Uma recente sondagem realizada nesse país, promovida pela National Campaign to Prevent Teen and Unplanned Pregnancy, com 1280 adolescentes e jovens, com idades compreendidas entre os 13 e os 26 anos, revela que entre 20% (13-19 anos) e 33% (20-26 anos) dos entrevistados já usou o telemóvel para captar e divulgar imagens de conteúdo sexual. Cerca de um terço dos rapazes entrevistados e um quarto das raparigas, com idades entre os 13 e os 19 anos, referiu que já tinham recebido imagens com nudez total ou parcial que originalmente eram privadas, mas que circulavam abundantemente entre os jovens.

Enquanto as autoridades americanas estão a olhar para o problema com preocupação e a actuar com dureza,o assunto ainda é pouco discutido em Portugal. Porém, este é um fenómeno global, com repercussões graves e envolvendo vários riscos: exploração sexual, violação do direito à privacidade, chantagem, etc. Os adolescentes não se apercebem do perigo destas situações. Uma vez tirada a fotografia e divulgada por telemóvel ou internet, perde-se por completo o controlo do seu destino. Deste modo, rapidamente estas imagens surgem em sites pornográficos, muitos deles visitados por pedófilos ávidos de encontrar uma presa.

Na verdade, é impraticável garantir a privacidade através dos meios electrónicos. Além disso, o anonimato é quase impossível dado que é relativamente fácil cruzar informação na internet. Não obstante este facto, é errado criar um ambiente de pânico ou censurar o acesso dos jovens às novas tecnologias. O mais importante é saber como as utilizar devidamente. Os pais têm aqui um papel fundamental, devendo alertar os filhos para estes perigos e procurar saber sempre o que andam a fazer e com quem habitualmente comunicam na internet.

Por outro lado, o “sexting” é um sintoma que reflecte uma sociedade enferma. No campo da sexualidade, passámos de um modelo de educação demasiado normativo (com regras rígidas e conteúdo moral por vezes desadequado), para outro totalmente permissivo, desequilibrado e que nalgumas situações fomenta a perversidade. Ora, educar não é apenas informar, mas orientar e transmitir valores que possam ajudar a realizar escolhas responsáveis. Talvez seja por isso que actualmente nos EUA se fala cada vez mais em sexualidade responsável, enquanto por cá as políticas ligadas à educação sexual dos jovens têm-se limitado praticamente à distribuição de preservativos, o que é manifestamente insuficiente.De outro modo caímos no campo dos instintos, numa sexualidade totalmente hedonista, sem pensamento, governada apenas pelo corpo e pelos desejos, conduzindo inevitavelmente a modelos aberrantes de comportamento.

O “sexting”, do meu ponto de vista, é um sinal de que algo está errado na forma como os jovens estão a viver a sua sexualidade. Mas creio que, sobre esta matéria, ainda não vimos mais do que a ponta do icebergue.

Pedro Afonso

Médico Psiquiatra

 

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